Presidência
da República
Secretaria-Geral
Subchefia para Assuntos
Jurídicos
LEI Nº 14.344, DE 24 DE MAIO DE 2022
Cria
mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e
familiar contra a criança e o adolescente, nos
termos do § 8º do art. 226 e do § 4º do art. 227 da Constituição
Federal e das disposições específicas previstas em tratados, convenções
ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte; altera o Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e as Leis nºs 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução
Penal), 8.069,
de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), 8.072, de 25 de
julho de 1990 (Lei de Crimes Hediondos), e 13.431,
de 4 de abril de 2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos
da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência; e dá outras
providências. |
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a
seguinte Lei:
Art. 1º Esta Lei cria
mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar
contra a criança e o adolescente, nos termos do § 8º
do art. 226 e do § 4º do art. 227 da Constituição
Federal e das disposições específicas previstas em tratados, convenções e
acordos internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil, e
altera o Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), e as Leis nºs 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução
Penal), 8.069, de
13 de julho de 1990, (Estatuto da Criança e do Adolescente), 8.072, de 25 de
julho de 1990 (Lei de Crimes Hediondos), e 13.431,
de 4 de abril de 2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da
criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência.
CAPÍTULO I
DA VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
Art. 2º Configura violência
doméstica e familiar contra a criança e o adolescente
qualquer ação ou omissão que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual,
psicológico ou dano patrimonial:
I - no âmbito do
domicílio ou da residência da criança e do adolescente, compreendida como o
espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar,
inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da
família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que compõem a
família natural, ampliada ou substituta, por laços naturais, por afinidade ou
por vontade expressa;
III - em qualquer relação doméstica e familiar
na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a vítima, independentemente
de coabitação.
Parágrafo único. Para a caracterização da
violência prevista no caput deste artigo, deverão ser
observadas as definições estabelecidas na Lei
nº 13.431, de 4 de abril de 2017.
Art. 3º A violência doméstica
e familiar contra a criança e o adolescente constitui
uma das formas de violação dos direitos humanos.
Art. 4º As estatísticas sobre
a violência doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente serão incluídas nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema
de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Sistema Único de
Saúde, do Sistema Único de Assistência Social e do Sistema de Justiça e
Segurança, de forma integrada, a fim de subsidiar o sistema nacional de dados e
informações relativo às crianças e aos adolescentes.
§ 1º Por meio da descentralização
político-administrativa que prevê o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança
e do Adolescente, os entes federados poderão remeter suas informações para a
base de dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública e do Ministério da
Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
§ 2º Os serviços deverão compartilhar entre si,
de forma integrada, as informações coletadas das vítimas, dos membros da
família e de outros sujeitos de sua rede afetiva, por meio de relatórios, em
conformidade com o fluxo estabelecido, preservado o sigilo das informações.
§ 3º O compartilhamento completo do registro de
informações será realizado por meio de encaminhamento ao serviço, ao programa
ou ao equipamento do sistema de garantia de direitos da criança e do
adolescente vítima ou testemunha de violência, que acolherá, em seguida, a
criança ou o adolescente vítima ou testemunha de violência.
§ 4º O compartilhamento de informações de que trata
o § 3º deste artigo deverá zelar pelo sigilo dos dados pessoais da criança e do
adolescente vítima ou testemunha de violência.
§ 5º Será adotado modelo de registro de
informações para compartilhamento do sistema de garantia de direitos da criança
e do adolescente vítima ou testemunha de violência, que conterá, no mínimo:
I - os dados pessoais
da criança ou do adolescente;
II - a descrição do
atendimento;
III - o relato espontâneo da criança ou do
adolescente, quando houver;
IV - os
encaminhamentos efetuados.
Art. 5º O Sistema de Garantia
dos Direitos da Criança e do Adolescente intervirá nas situações de violência
contra a criança e o adolescente com a finalidade de:
I - mapear as
ocorrências das formas de violência e suas particularidades no território
nacional;
II - prevenir os atos
de violência contra a criança e o adolescente;
III - fazer cessar a violência quando esta
ocorrer;
IV - prevenir a
reiteração da violência já ocorrida;
V - promover o
atendimento da criança e do adolescente para minimizar as sequelas da violência
sofrida; e
VI - promover a
reparação integral dos direitos da criança e do adolescente.
CAPÍTULO II
DA ASSISTÊNCIA À
CRIANÇA E AO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Art. 6º A assistência à
criança e ao adolescente em situação de violência doméstica e familiar será
prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos
nas Leis nºs 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança
e do Adolescente), e 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança
Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e
emergencialmente, quando for o caso.
Art. 7º A União, o Distrito
Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, para a criança e o adolescente em situação de violência doméstica e
familiar, no limite das respectivas competências e de acordo com o art. 88 da Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente):
I - centros de
atendimento integral e multidisciplinar;
II - espaços para
acolhimento familiar e institucional e programas de apadrinhamento;
III - delegacias, núcleos de defensoria
pública, serviços de saúde e centros de perícia médico-legal especializados;
IV - programas e campanhas
de enfrentamento da violência doméstica e familiar;
V - centros de
educação e de reabilitação para os agressores.
Art. 8º O Sistema de Garantia
dos Direitos da Criança e do Adolescente, juntamente com os sistemas de
justiça, de saúde, de segurança pública e de assistência social, os Conselhos
Tutelares e a comunidade escolar, poderão, na esfera de sua competência, adotar
ações articuladas e efetivas direcionadas à identificação da agressão, à
agilidade no atendimento da criança e do adolescente vítima de violência
doméstica e familiar e à responsabilização do agressor.
Art. 9º Os Estados e o
Distrito Federal, na formulação de suas políticas e planos de atendimento à
criança e ao adolescente em situação de violência doméstica e familiar, darão
prioridade, no âmbito da Polícia Civil, à criação de Delegacias Especializadas
de Proteção à Criança e ao Adolescente.
Art. 10. A União, os Estados,
o Distrito Federal e os Municípios poderão estabelecer dotações orçamentárias
específicas, em cada exercício financeiro, para a implementação das medidas
estabelecidas nesta Lei.
CAPÍTULO III
DO ATENDIMENTO
PELA AUTORIDADE POLICIAL
Art. 11. Na hipótese de
ocorrência de ação ou omissão que implique a ameaça ou a prática de violência
doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência
adotará, de imediato, as providências legais cabíveis.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste
artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida.
Art. 12. O depoimento da
criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e familiar
será colhido nos termos da Lei
nº 13.431, de 4 de abril de 2017, observadas as disposições da Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Art. 13. No atendimento à
criança e ao adolescente em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade
policial deverá, entre outras providências:
I - encaminhar a
vítima ao Sistema Único de Saúde e ao Instituto Médico-Legal imediatamente;
II - encaminhar a
vítima, os familiares e as testemunhas, caso sejam crianças ou adolescentes, ao
Conselho Tutelar para os encaminhamentos necessários, inclusive para a adoção
das medidas protetivas adequadas;
III - garantir proteção policial, quando
necessário, comunicados de imediato o Ministério Público e o Poder Judiciário;
IV - fornecer
transporte para a vítima e, quando necessário, para seu responsável ou
acompanhante, para serviço de acolhimento existente ou local seguro, quando
houver risco à vida.
Art. 14. Verificada a
ocorrência de ação ou omissão que implique a ameaça ou a prática de violência
doméstica e familiar, com a existência de risco atual ou iminente à vida
ou à integridade física da criança e do adolescente, ou de seus familiares,
o agressor será imediatamente afastado do lar, do domicílio ou do local de
convivência com a vítima:
I - pela autoridade
judicial;
II - pelo delegado de
polícia, quando o Município não for sede de comarca;
III - pelo policial, quando o Município não for
sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia.
§ 1º O Conselho Tutelar poderá representar às
autoridades referidas nos incisos I, II e III do caput deste
artigo para requerer o afastamento do agressor do lar, do domicílio ou do local
de convivência com a vítima.
§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos II e
III do caput deste artigo, o juiz será comunicado no prazo
máximo de 24 (vinte e quatro) horas e decidirá, em igual prazo, sobre a
manutenção ou a revogação da medida aplicada, bem como dará ciência ao
Ministério Público concomitantemente.
§ 3º Nos casos de risco à integridade física da
vítima ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida
liberdade provisória ao preso.
CAPÍTULO IV
DOS
PROCEDIMENTOS
Seção I
Das Medidas
Protetivas de Urgência
Art. 15. Recebido o expediente
com o pedido em favor de criança e de adolescente em situação de violência
doméstica e familiar, caberá ao juiz, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas:
I - conhecer do
expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;
II - determinar o
encaminhamento do responsável pela criança ou pelo adolescente ao órgão de
assistência judiciária, quando for o caso;
III - comunicar ao Ministério Público para que
adote as providências cabíveis;
IV - determinar a
apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor.
Art. 16. As medidas protetivas
de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério
Público, da autoridade policial, do Conselho Tutelar ou a pedido da pessoa que
atue em favor da criança e do adolescente.
§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão
ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de
manifestação do Ministério Público, o qual deverá ser prontamente comunicado.
§ 2º As medidas protetivas de urgência serão
aplicadas isolada ou cumulativamente e poderão ser substituídas a qualquer
tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta
Lei forem ameaçados ou violados.
§ 3º Poderá o juiz, a requerimento do
Ministério Público ou do Conselho Tutelar, ou a pedido da vítima ou de quem
esteja atuando em seu favor, conceder novas medidas protetivas de urgência ou
rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da vítima, de
seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.
Art. 17. Em qualquer fase do
inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do
agressor, decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou mediante
representação da autoridade policial.
Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão
preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que
subsista, bem como decretá-la novamente, se sobrevierem razões que a
justifiquem.
Art. 18. O responsável legal
pela criança ou pelo adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e
familiar, desde que não seja o autor das agressões, deverá ser notificado dos
atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao
ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído
ou do defensor público.
Art. 19. O juiz competente
providenciará o registro da medida protetiva de urgência.
Parágrafo único. As medidas protetivas de
urgência serão, após sua concessão, imediatamente registradas em banco de dados
mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça, garantido o acesso
instantâneo do Ministério Público, da Defensoria Pública, dos órgãos de segurança
pública e de assistência social e dos integrantes do Sistema de Garantia dos
Direitos da Criança e do Adolescente, com vistas à fiscalização e à efetividade
das medidas protetivas.
Seção II
Das Medidas
Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor
Art. 20. Constatada a prática
de violência doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente nos termos desta Lei, o juiz poderá determinar ao agressor, de
imediato, em conjunto ou separadamente, a aplicação das seguintes medidas
protetivas de urgência, entre outras:
I - a suspensão da
posse ou a restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente,
nos termos da Lei nº
10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - o afastamento do
lar, do domicílio ou do local de convivência com a vítima;
III - a proibição de aproximação da vítima, de
seus familiares, das testemunhas e de noticiantes ou denunciantes, com a
fixação do limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
IV - a vedação de
contato com a vítima, com seus familiares, com testemunhas e com noticiantes ou
denunciantes, por qualquer meio de comunicação;
V - a proibição de
frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da criança ou do adolescente, respeitadas as disposições da Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
VI - a restrição ou a
suspensão de visitas à criança ou ao adolescente;
VII - a prestação de alimentos provisionais ou
provisórios;
VIII - o comparecimento a programas de
recuperação e reeducação;
IX - o acompanhamento
psicossocial, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
§ 1º As medidas referidas neste artigo não
impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a
segurança da vítima ou as circunstâncias o exigirem, e todas as medidas devem
ser comunicadas ao Ministério Público.
§ 2º Na hipótese de aplicação da medida
prevista no inciso I do caput deste artigo, encontrando-se o
agressor nas condições referidas no art. 6º da Lei nº
10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão,
corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e
determinará a restrição do porte de armas, e o superior imediato do agressor
ficará responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de
incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
§ 3º Para garantir a efetividade das medidas
protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio
da força policial.
Seção III
Das Medidas
Protetivas de Urgência à Vítima
Art. 21. Poderá o juiz, quando
necessário, sem prejuízo de outras medidas, determinar:
I - a proibição do
contato, por qualquer meio, entre a criança ou o adolescente vítima ou
testemunha de violência e o agressor;
II - o afastamento do
agressor da residência ou do local de convivência ou de coabitação;
III - a prisão preventiva do agressor, quando
houver suficientes indícios de ameaça à criança ou ao adolescente vítima ou
testemunha de violência;
IV - a inclusão da
vítima e de sua família natural, ampliada ou substituta nos atendimentos a que
têm direito nos órgãos de assistência social;
V - a inclusão da
criança ou do adolescente, de familiar ou de noticiante ou denunciante em
programa de proteção a vítimas ou a testemunhas;
VI - no caso da
impossibilidade de afastamento do lar do agressor ou de prisão, a remessa do
caso para o juízo competente, a fim de avaliar a necessidade de acolhimento
familiar, institucional ou colação em família substituta;
VII - a realização da matrícula da criança ou
do adolescente em instituição de educação mais próxima de seu domicílio ou do
local de trabalho de seu responsável legal, ou sua transferência para
instituição congênere, independentemente da existência de vaga.
§ 1º A autoridade policial poderá requisitar e
o Conselho Tutelar requerer ao Ministério Público a propositura de ação
cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência
contra a criança e o adolescente, observadas as
disposições da Lei
nº 13.431, de 4 de abril de 2017.
§ 2º O juiz poderá determinar a adoção de
outras medidas cautelares previstas na legislação em vigor, sempre que as
circunstâncias o exigirem, com vistas à manutenção da integridade ou da
segurança da criança ou do adolescente, de seus familiares e de noticiante ou
denunciante.
CAPÍTULO V
DO MINISTÉRIO
PÚBLICO
Art. 22. Caberá ao Ministério
Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e
familiar contra a criança e o adolescente, quando
necessário:
I - registrar em seu
sistema de dados os casos de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;
II - requisitar força
policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de
segurança, entre outros;
III - fiscalizar os estabelecimentos públicos e
particulares de atendimento à criança e ao adolescente em situação de violência
doméstica e familiar e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou
judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas.
CAPÍTULO VI
DA PROTEÇÃO AO
NOTICIANTE OU DENUNCIANTE DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Art. 23. Qualquer pessoa que
tenha conhecimento ou presencie ação ou omissão, praticada em local público ou
privado, que constitua violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente tem o dever de comunicar o fato imediatamente
ao serviço de recebimento e monitoramento de denúncias, ao Disque 100 da
Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e
dos Direitos Humanos, ao Conselho Tutelar ou à autoridade policial, os quais,
por sua vez, tomarão as providências cabíveis.
Art. 24. O poder público
garantirá meios e estabelecerá medidas e ações para a proteção e a compensação
da pessoa que noticiar informações ou denunciar a prática de violência, de
tratamento cruel ou degradante ou de formas violentas de educação, correção ou
disciplina contra a criança e o adolescente.
§ 1º A União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios poderão estabelecer programas de proteção e compensação das
vítimas, das testemunhas e dos noticiantes ou denunciantes das condutas
previstas no caput deste artigo.
§ 2º O noticiante ou denunciante poderá
requerer que a revelação das informações de que tenha conhecimento seja feita
perante a autoridade policial, o Conselho Tutelar, o Ministério Público ou o
juiz, caso em que a autoridade competente solicitará sua presença, designando
data e hora para audiência especial com esse fim.
§ 3º O noticiante ou denunciante poderá
condicionar a revelação de informações de que tenha conhecimento à execução das
medidas de proteção necessárias para assegurar sua integridade física e
psicológica, e caberá à autoridade competente requerer e deferir a adoção das
medidas necessárias.
§ 4º Ninguém será submetido a retaliação, a
represália, a discriminação ou a punição pelo fato ou sob o fundamento de ter
reportado ou denunciado as condutas descritas no caput deste
artigo.
§ 5º O noticiante ou denunciante que, na
iminência de revelar as informações de que tenha conhecimento, ou após tê-lo
feito, ou que, no curso de investigação, de procedimento ou de processo
instaurado a partir de revelação realizada, seja coagido ou exposto a grave
ameaça, poderá requerer a execução das medidas de proteção previstas na Lei nº 9.807, de 13
de julho de 1999, que lhe sejam aplicáveis.
§ 6º O Ministério Público manifestar-se-á sobre
a necessidade e a utilidade das medidas de proteção formuladas pelo noticiante
ou denunciante e requererá ao juiz competente o deferimento das que entender
apropriadas.
§ 7º Para a adoção das medidas de proteção,
considerar-se-á, entre outros aspectos, a gravidade da coação ou da ameaça à
integridade física ou psicológica, a dificuldade de preveni-las ou de
reprimi-las pelos meios convencionais e a sua importância para a produção de
provas.
§ 8º Em caso de urgência e levando em
consideração a procedência, a gravidade e a iminência da coação ou ameaça, o
juiz competente, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, determinará
que o noticiante ou denunciante seja colocado provisoriamente sob a proteção de
órgão de segurança pública, até que o conselho deliberativo decida sobre sua
inclusão no programa de proteção.
§ 9º Quando entender necessário, o juiz
competente, de ofício, a requerimento do Ministério Público, da autoridade
policial, do Conselho Tutelar ou por solicitação do órgão deliberativo
concederá as medidas cautelares direta ou indiretamente relacionadas à eficácia
da proteção.
CAPÍTULO VII
DOS CRIMES
Art. 25. Descumprir decisão
judicial que defere medida protetiva de urgência prevista nesta Lei:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois)
anos.
§ 1º A configuração do crime independe da
competência civil ou criminal do juiz que deferiu a medida.
§ 2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas
a autoridade judicial poderá conceder fiança.
§ 3º O disposto neste artigo não exclui a
aplicação de outras sanções cabíveis.
Art. 26. Deixar de comunicar à
autoridade pública a prática de violência, de tratamento cruel ou degradante ou
de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra criança ou
adolescente ou o abandono de incapaz:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três)
anos.
§ 1º A pena é aumentada de metade, se da
omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta
morte.
§ 2º Aplica-se a pena em dobro se o crime é
praticado por ascendente, parente consanguíneo até terceiro grau, responsável
legal, tutor, guardião, padrasto ou madrasta da vítima.
CAPÍTULO VIII
DISPOSIÇÕES
FINAIS
Art. 27. Fica instituído, em
todo o território nacional, o dia 3 de maio de cada ano como Dia Nacional de
Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Criança e o
Adolescente, em homenagem ao menino Henry Borel.
Art. 28. O caput do
art. 4º da Lei
nº 13.431, de 4 de abril de 2017, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso
V:
“Art. 4º
...................................................................................................................
................................................................................................................................
V - violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus documentos
pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluídos os
destinados a satisfazer suas necessidades, desde que a medida não se enquadre
como educacional.
........................................................................................................................”
(NR)
Art. 29. Os arts. 18-B, 70-A, 70-B, 136, 201 e 226 da Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), passam a
vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 18-B.
...............................................................................................................
.................................................................................................................................
VI - garantia de tratamento de saúde especializado à vítima.
.........................................................................................................................................”
(NR)
“Art. 70-A.
..............................................................................................................
................................................................................................................................
VII - a promoção
de estudos e pesquisas, de estatísticas e de outras informações relevantes às
consequências e à frequência das formas de violência contra a criança e o adolescente para a sistematização de dados nacionalmente
unificados e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;
VIII - o respeito
aos valores da dignidade da pessoa humana, de forma a coibir a violência, o
tratamento cruel ou degradante e as formas violentas de educação, correção ou
disciplina;
IX - a promoção e
a realização de campanhas educativas direcionadas ao público escolar e à
sociedade em geral e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos
direitos humanos das crianças e dos adolescentes, incluídos os canais de
denúncia existentes;
X - a celebração de convênios, de protocolos, de ajustes, de
termos e de outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos
governamentais ou entre estes e entidades não governamentais, com o objetivo de
implementar programas de erradicação da violência, de tratamento cruel ou degradante
e de formas violentas de educação, correção ou disciplina;
XI - a capacitação
permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de
Bombeiros, dos profissionais nas escolas, dos Conselhos Tutelares e dos
profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas referidos no inciso II
deste caput, para que identifiquem situações em que crianças e
adolescentes vivenciam violência e agressões no âmbito familiar ou
institucional;
XII - a promoção
de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito
à dignidade da pessoa humana, bem como de programas de fortalecimento da
parentalidade positiva, da educação sem castigos físicos e de ações de
prevenção e enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;
XIII - o destaque,
nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, dos conteúdos relativos
à prevenção, à identificação e à resposta à violência doméstica e familiar.
........................................................................................................................”
(NR)
“Art. 70-B. As
entidades, públicas e privadas, que atuem nas áreas da saúde e da educação,
além daquelas às quais se refere o art. 71 desta Lei, entre outras, devem
contar, em seus quadros, com pessoas capacitadas a reconhecer e a comunicar ao
Conselho Tutelar suspeitas ou casos de crimes praticados contra a criança e o adolescente.
.......................................................................................................................”
(NR)
“Art. 136.
.................................................................................................................
.................................................................................................................................
XIII - adotar, na
esfera de sua competência, ações articuladas e efetivas direcionadas à
identificação da agressão, à agilidade no atendimento da criança e do
adolescente vítima de violência doméstica e familiar e à responsabilização do
agressor;
XIV - atender à
criança e ao adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e
familiar, ou submetido a tratamento cruel ou degradante ou a formas violentas
de educação, correção ou disciplina, a seus familiares e a testemunhas, de
forma a prover orientação e aconselhamento acerca de seus direitos e dos
encaminhamentos necessários;
XV - representar à autoridade judicial ou policial para requerer
o afastamento do agressor do lar, do domicílio ou do local de convivência com a
vítima nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;
XVI - representar
à autoridade judicial para requerer a concessão de medida protetiva de urgência
à criança ou ao adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e
familiar, bem como a revisão daquelas já concedidas;
XVII - representar
ao Ministério Público para requerer a propositura de ação cautelar de
antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a
criança e o adolescente;
XVIII - tomar as
providências cabíveis, na esfera de sua competência, ao receber comunicação da
ocorrência de ação ou omissão, praticada em local público ou privado, que
constitua violência doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente;
XIX - receber e
encaminhar, quando for o caso, as informações reveladas por noticiantes ou
denunciantes relativas à prática de violência, ao uso de tratamento cruel ou
degradante ou de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a
criança e o adolescente;
XX - representar à autoridade judicial ou ao Ministério Público
para requerer a concessão de medidas cautelares direta ou indiretamente
relacionada à eficácia da proteção de noticiante ou denunciante de informações
de crimes que envolvam violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente.
....................................................................................................................”
(NR)
“Art. 201.
.............................................................................................................
.............................................................................................................................
XIII - intervir,
quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes de violência
doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente.
...................................................................................................................”
(NR)
“Art. 226.
............................................................................................................
§ 1º Aos crimes
cometidos contra a criança e o adolescente,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26
de setembro de 1995.
§ 2º Nos casos de
violência doméstica e familiar contra a criança e o
adolescente, é vedada a aplicação de penas de cesta básica ou de outras de
prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento
isolado de multa.” (NR)
Art. 30. O parágrafo único do
art. 152 da Lei
nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 152.
............................................................................................................
Parágrafo único.
Nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança, o adolescente e a
mulher e de tratamento cruel ou degradante, ou de uso de formas violentas de
educação, correção ou disciplina contra a criança e o
adolescente, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor
a programas de recuperação e reeducação.” (NR)
Art. 31. Os arts. 111, 121 e 141 do Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passam a vigorar com
as seguintes alterações:
“Art. 111.
.............................................................................................................
..............................................................................................................................
V - nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam
violência contra a criança e o adolescente, previstos
neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18
(dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.”
(NR)
“Art. 121.
............................................................................................................
.............................................................................................................................
§ 2º
......................................................................................................................
..............................................................................................................................
Homicídio contra
menor de 14 (quatorze) anos
IX - contra menor de 14 (quatorze) anos:
..............................................................................................................................
§ 2º-B. A pena do
homicídio contra menor de 14 (quatorze) anos é aumentada de:
I - 1/3 (um terço)
até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que implique o
aumento de sua vulnerabilidade;
II - 2/3 (dois
terços) se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer
outro título tiver autoridade sobre ela.
.............................................................................................................................
§ 7º
......................................................................................................................
..............................................................................................................................
II - contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência
ou com doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de
vulnerabilidade física ou mental;
.....................................................................................................................”
(NR)
“Art. 141. ..............................................................................................................
...............................................................................................................................
IV - contra criança, adolescente, pessoa maior de 60 (sessenta)
anos ou pessoa com deficiência, exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140
deste Código.
......................................................................................................................”
(NR)
Art. 32. O inciso I do caput do
art. 1º da Lei
nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei de Crimes Hediondos), passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1º
...................................................................................................................
I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de
grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio
qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII e IX);
.......................................................................................................................”
(NR)
Art. 33. Aos procedimentos
regulados nesta Lei aplicam-se subsidiariamente, no que couber, as disposições
das Leis nºs 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da
Criança e do Adolescente), 11.340,
de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), e 13.431,
de 4 de abril de 2017.
Art. 34. Esta Lei entra em
vigor após decorridos 45 (quarenta e cinco) dias de sua publicação
oficial.
Brasília, 24 de maio de 2022; 201o da
Independência e 134o da República.
JAIR MESSIAS BOLSONARO
Anderson Gustavo Torres
Cristiane Rodrigues Britto
Este texto não
substitui o publicado no DOU de 25.5.2022