Timbre
Ministério da Justiça e Segurança Pública

 

PORTARIA CONJUNTA Nº 10, de 26 de setembro de 2022

  

Estabelece medidas cautelares para a proteção de indígenas isolados nos limites da Reserva Extrativista do Médio Purus enquanto não é celebrado Acordo de Cooperação Técnica entre a Funai e ICMBio específico para a situação em pauta. (Processo SEI nº 02119.001465/2021-19)

O PRESIDENTE DO INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE - ICMBio, no uso das competências atribuídas pelo artigo 24 do Decreto nº 10.234, de 11 de fevereiro de 2020 e pela Portaria nº 1.280, de 9 de novembro de 2021, da Casa Civil, e publicada no Diário Oficial da União em 10 de novembro de 2021, seção 2,

Considerando o art. 231 da Constituição da República, que reconhece aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições;

Considerando as diretrizes internacionais da Organização das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos para a proteção de povos indígenas isolados;

Considerando o disposto no art. 45 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999;

Considerando que Povos Indígenas Isolados são povos ou segmentos de povos indígenas que, sob a perspectiva do Estado brasileiro, não mantêm contatos intensos ou constantes com a população majoritária e evitam contatos com pessoas exógenas a seu coletivo, caracterizando-se por alta vulnerabilidade social e epidemiológica;

Considerando que as Comunidades Tradicionais são grupos culturalmente diferenciados que se reconhecem como tais, possuem formas próprias de organização social e ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição;

Considerando o disposto no art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Fe d e r a l ;

Considerando o que determina o art. 18, § 1º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências, segundo o qual "a Reserva Extrativista é de domínio público, com uso concedido às populações extrativistas tradicionais conforme o disposto no art. 23 desta Lei e em regulamentação específica, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei".

Considerando a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais-PNPCT, instituída pelo Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007 e o Plano de Manejo da Reserva Extrativista do Médio Purus (AM), aprovado pela Portaria ICMBio nº 338, de 7 de maio de 2020.

Considerando que a Reserva Extrativista do Médio Purus consiste em unidade de conservação federal criada com o objetivo de "proteger os meios de vida e garantir a utilização e a conservação dos recursos naturais renováveis tradicionalmente utilizados pelas comunidades" incidentes na sua área de abrangência, conforme o art. 2º do Decreto de 8 de maio de 2008 (publicado no DOU em 09.05.2008, Seç. 1, pp. 21-22), que dispõe sobre a sua criação;

Considerando que o referido Decreto de 8 de maio de 2008 determina, em seu artigo art. 6º: "Fica facultada à Fundação Nacional do Índio-FUNAI a continuidade dos levantamentos da área de ocupação dos grupos indígenas isolados nos limites da Reserva Extrativista do Médio Purus";

Considerando que em determinadas áreas no norte da RESEX do Médio Purus há presença constatada de grupos indígenas isolados, provavelmente relacionados ao povo indígena Hi-Merimã habitante da Terra Indígena homônima, contígua a essa R ES E X ;

Considerando a necessidade de estabelecimento de cooperação entre Funai e ICMBio diante da intensificação dessa presença, caracterizada pelo trânsito e ocupação sazonal pelos isolados de fração territorial da RESEX do Médio Purus, inclusive em áreas também exploradas pelas comunidades tradicionais;

Considerando que o Estado brasileiro deve, por meio de suas instituições, acompanhar o desenvolvimento dessa situação de superposição, monitorar e investigar a dinâmica territorial dos isolados e garantir-lhes, enquanto isso, o "exercício de sua liberdade e de suas atividades tradicionais sem a obrigatoriedade de contatá-los", segundo o princípio da política indigenista de Estado de não-contato com povos indígenas em isolamento voluntário inscrito no art. 2º, inciso II, alínea d, do Anexo I do Decreto nº 9.010/17;

Considerando a responsabilidade do Estado brasileiro de impedir, por meio da atuação decisiva de suas instituições, a ocorrência de contato de qualquer natureza com os indígenas isolados em pauta e, em última instância, evitar a possibilidade de surgimento de situações de conflito com os não índios habitantes da RESEX do Médio Purus, atuando os signatários especialmente através do monitoramento e proteção territorial, de modo a resguardar-se da imposição de medidas permanentes de restrição de uso ou acesso ao território em questão;

Considerando a tramitação de Acordo de Cooperação Técnica-ACT a ser celebrado entre Funai e ICMBio com o objetivo de garantir a proteção dos grupos indígenas isolados que ocupam parte do território da RESEX do Médio Purus, associada à preservação dos direitos das comunidades tradicionais que dela usufruem, através do estabelecimento de atuação conjunta entre Funai e ICMBio;

Considerando que a celebração desse ACT requer tempo de tramitação prévia e interna aos órgãos, fazendo com que o instrumento só possa ser alcançado em etapa posterior à atual necessidade de atuação emergencial, sendo necessária, portanto, a efetivação desta Portaria Conjunta como medida cautelar para viabilizar a execução de ações de monitoramento e proteção territorial em caráter de urgência;

Considerando o disposto na Portaria FUNAI nº 281, de 20 de abril de 2000, que estabelece diretrizes da Política de Proteção aos Povos Indígenas Isolados e considera prioritária a saúde dos indígenas isolados, devendo esta ser objeto de especial atenção, decorrente de sua especificidade;

Considerando que o Plano de Contingência para Situações de Contato com Povos Indígenas Isolados - Referência nº 13, "Hi-Merimã" é um planejamento conjunto elaborado pela SESAI/MS e FUNAI, tendo como parceiro o ICMBio e outras instituições, para conduzir a resposta do Estado brasileiro a situações de contato com o referido povo indígena isolado, abrangendo um conjunto de atividades e procedimentos para estabelecer medidas de prevenção e mitigação dos efeitos negativos desse tipo de evento, que acarreta sérios riscos à integridade física desses indígenas, de natureza principalmente epidemiológica;

Considerando o risco iminente de estabelecimento de contato involuntário entre os isolados Hi-Merimã e membros das comunidades tradicionais habitantes da RESEX do Médio Purus; Considerando o constante dos autos dos processos SEI/Funai n° 08116.001047/2021-38 e SEI/ICMBio nº 02119.001465/2021-19;, resolvem:

Art. 1º Estabelecer medidas cautelares para a proteção de indígenas isolados nos limites da RESEX do Médio Purus, localizada nos Municípios de Lábrea, Pauiní e Tapauá, no Estado do Amazonas.

Art. 2º Fica determinado às setoriais competentes da Funai e ICMBio, na forma dos correspondentes regimentos internos, que implementem controle de acesso e do uso de recursos naturais nas áreas da RESEX do Médio Purus em que identificada a presença atual ou recente de grupos indígenas isolados.

§ 1º O controle de acesso de que dispõe o caput tem por objetivo proteger os indígenas isolados, o seu modo de vida e os seus direitos, na forma e nos termos da legislação vigente e incidente na espécie.

§ 2º Para maior e melhor efetivação desse controle, as setoriais competentes da Funai e do ICMBio devem operacionalizar, de modo emergencial e com a maior brevidade possível, uma base operacional conjunta, custeada pela FUNAI, no interior da RESEX do Médio Purus, localizada na foz do Rio Mamoriá-Grande em área de terra firme denominada "Fazendinha" (local com supressão vegetal já existente) e, se necessário, instalação de pontos de apoio para as equipe de campo nos locais: confluência dos Igarapés Macaco e São Benedito; Saudade e Igarapé Grande.

Art. 3º Esta Portaria Conjunta terá vigência até a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre Funai e ICMBio para a situação ou até que sobrevenha decisão em sentido contrário, o que ocorrer primeiro.

Art. 4º Esta Portaria Conjunta entra em vigor na data de sua publicação.

 

MARCOS DE CASTRO SIMANOVIC

Presidente do ICMBio

MARCELO AUGUSTO XAVIER DA SILVA

Presidente da Funai

Este texto não substitui o original publicado nos veículos oficiais (Diário Oficial da União - DOU e Boletim de Serviço - BS).